Clássicos da Literatura Brasileira: Veja 15 Obras Recomendadas

Um Livro Cheio de Intensos Mergulhos Naquilo que Há de Mais Fundo em Nós

A Hora da Estrela conta a história de Macabéa, nordestina que mora no Rio de Janeiro. Miserável, sem amigos e de existência fina e quase invisível, ela é solitária, mesmo diante de alguns raros vislumbres e deslumbres. Disse uma cartomante que sua vida seria brilhante. Mas será? 

O romance, último livro escrito por Clarice Lispector, é um livro de 13 títulos, e através da figura de Macabéa joga com as múltiplas possibilidades que se podem abrir na vida e a força daquilo que parece tornar fatais alguns destinos. 

Navegando pela subjetividade da personagem e pelas dinâmicas sociais da desigualdade, Clarice constrói um romance brevíssimo mas que, ao mesmo tempo, comporta em si todo um mundo: um mundo de sonhos e frustrações, de grandes acontecimentos e pequenos nada da vida comum, de alegrias possíveis e de imensas e ocas tristezas, de projetos e de acasos.

Um Livro Singular

É difícil falar sobre Clarice… uma autora conhecida por todos, mas ainda assim tão misteriosa. Água Viva é um livro de narrativa muito íntima e veloz. De início, parece que estamos lendo um diário, mas as palavras da personagem-autora se transformam, e vamos percebendo que é muito além disso. 

É como se ela estivesse tentando entender a si própria enquanto escreve o que se passa por sua cabeça… chega até mesmo a admitir não gostar de algo que escreveu no parágrafo anterior, mas não apaga, pois aquilo lhe aconteceu, então existe, é preciso estar ali. 

É fácil se identificar com algumas angústias e preocupações da personagem, e essa forma direta de falar com o leitor foi o que mais me encantou ao ler Água Viva, que foi o primeiro livro de Clarice que li, ainda na adolescência, e releio sempre que posso.

Água Viva é romance, poesia, monólogo, carta, pensamento; é tudo, simplesmente é!

Um Livro que Emociona, Encanta e Ensina

Publicado em 1968, Meu Pé de Laranja Lima é um clássico com cunho autobiográfico, que se passa na década de 1930. O livro conta a história do menino Zezé, de 5 anos, que mora na Zona Oeste do Rio de Janeiro, em Bangu. Seu pai está desempregado, sua mãe trabalha arduamente em uma fábrica e seus irmãos ajudam nas tarefas domésticas e cuidando um do outro. 

Apesar de toda a pobreza da família, Zezé é uma criança de mente muito fértil. Ele aprende a ler e a escrever sozinho, é um menino muito levado e inteligente. Ao longo de toda a narrativa, vemos Zezé fazendo suas traquinagens e sendo muito punido pelos irmãos, pais e até vizinhos.

O pé de laranja lima chega na vida de Zezé quando sua família precisa se mudar. Ao longo da história, ele vai se apaixonando pela pequenina árvore e faz amizade com ela, inclusive, na sua fértil imaginação, conversa e desabafa todos os seus sentimentos com ela.

Um livro que me tocou profundamente, não só pelo enredo e toda a história linda e triste de Zezé, mas pelas lembranças da infância que pude experimentar, já que cita locais importantes da cidade do Rio de Janeiro, onde coincidentemente nasci e cresci. Meu Pé de Laranja Lima tem uma história triste e comovente, porém que nos ensina muita coisa. Super recomendo!

Um Grito de Resistência

“Quarto de Despejo”, a obra mais famosa de Carolina Maria de Jesus, é um clássico da literatura brasileira, um marco na literatura negra e um grito de resistência. Nesse diário a autora relata sua sobrevivência como catadora de papel na favela do Canindé nos anos 1960. Esta escrevivência, como cunhou Conceição Evaristo, prende, emociona e nos faz refletir.

Ler Carolina Maria de Jesus sempre é uma experiência fascinante e devastadora. Suas palavras tocam fundo, ferindo e curando na mesma proporção. Não espere sair inteiro após a leitura deste clássico — ou após ler qualquer livro da escritora — você vai sair mudado, destruído, reflexivo... e será uma experiência incrível.

Os escritos de Carolina Maria de Jesus são poderosos, marcantes para uma época, para todo um povo, uma comunidade… Permita-se ser transformado também! Leia Quarto de Despejo. Leia Casa de Alvenaria. Leia Diário de Bitita. Leia Meu Sonho é Escrever… Apenas leia Carolina Maria de Jesus.

Um Clássico que Reflete Sobre a Cultura, História e Religião Cristã no Brasil

Quando Madona de Cedro chegou às minhas mãos, eu tinha lido poucos livros na vida. Assumo que, com os meus 14 anos, não estava preparado para uma literatura com tantas camadas. Não sabia que um livro poderia me tocar e me transformar de tantas formas. 

Eu via o aprumo da linguagem de Callado e notava uma reflexão profunda e complexa da cultura cristã na sociedade brasileira. Ainda, percebia no livro um registro histórico de um Brasil que se entranha nas pessoas, nas personagens. Foi ali que descobri que a literatura era pura potência.

A história é a de Delfino Montiel, um comerciante de pedra-sabão que aceita roubar um santo da igreja e se envolve na culpa cristã em meio à cidade de Congonhas do Campo. A obra de Aleijadinho usurpada traz a Montiel uma purgação que repete a via sacra de Jesus.

Do Coração do Nordeste Brasileiro para o Mundo, do Drama ao Humor

Falar sobre Ariano Suassuna é falar sobre genialidade embrulhada na simplicidade, argumentar sobre regionalismo sem pompa, pés no chão, com propriedade; do jeitinho que deveria ser. Ariano rasga as amarras Recifenses e se lança pelo Brasil com uma de suas mais conhecidas obras: Auto da Compadecida.

A história em três atos, inspirada em publicações de cordel, conta a história de dois malandros no coração do Nordeste Brasileiro; João Grilo e Chicó; amigos na pobreza, fartura e gaiatice, enxergam a possibilidade de descolar uns bons trocados do Padeiro e sua Mulher – patrões de João Grilo – mediante a benção canônica do moribundo pet dos patrões.

O quiproquó rola solto quando uma legião de cangaceiros chega ao vilarejo recifense e bagunça a vida – e a morte – de todos, trazendo à baila questões como distinção de classes, preconceito, visão religiosa, fazendo cair por terra o maniqueísmo comum nas obras literárias e discutindo situações pautadas até hoje.

A trupe de personagens passeia com nomes, como o Padre João e o Cangaceiro Severino, e os sem identificação nominal, como os já citados Padeiro, Mulher e o Cabra; contudo, não se engane, todos têm relevância no enredo. Vale destacar a presença de três criaturas carismáticas na peça: Manuel (Jesus), Encourado (Diabo) e a Compadecida (Nossa Senhora). 

A Força e a Determinação São Pilares que Tempo Algum Consegue Corroer

Morte e Vida Severina é um poema de João Cabral de Melo Neto que retrata a vida dos retirantes pernambucanos. Eu o li pela primeira vez há 15 anos atrás. Escolhi este livro por retratar uma condição pela qual sei que alguns antepassados certamente passaram. 

Uma das coisas mais tocantes no poema de Melo Neto é a forma de ver a vida pelo olhar do retirante: um tanto quanto determinista e conformista perante sua situação. Ele não parece ter perspectivas de melhoras a cada cidade pela qual passa no percurso do rio. E mesmo ao avistar o mar, e chegando em Recife, sua sina não demonstra melhoras. 

Porém, o que temos é uma luz de esperança, ou ainda uma fagulha de resistência e sobrevivência quando, ao conversar com um antigo retirante, compreende (ou talvez não) que a busca por uma condição melhor, se não for por sua vida, será pela vida de seus descendentes. 

Pessoas que se interessam por história do Brasil e culturas regionais certamente gostarão desta leitura.

Um Livro Atual

O livro começa com a fuga de Fabiano, sua esposa, dois filhos e a cachorra Baleia. Eles fogem da seca, procuram um lugar para viver, até que encontram uma fazenda e resolvem abrigar-se lá. Quando a seca passa e a chuva molha a terra rachada, o dono volta e requer o que é seu. Porém, permite que Fabiano e sua família permaneçam ali como trabalhadores. 

O livro dedica um capítulo a cada um dos personagens, inclusive à cachorra Baleia, que tem um destaque e atenção muito especiais. Ela é tratada como gente, enquanto os humanos são animalizados. 

Um aspecto interessante do livro é sua estrutura. Ele é construído como se fosse desmontável. Os fatos não obedecem a uma ordem cronológica e não há conexão entre os capítulos para que um dependa do outro. Achei isso genial da parte do autor!

O que faz Vidas Secas ser um livro atual é a problemática que ele aborda: a seca. Foi esse o motivo de tê-lo escolhido para indicar, pois a seca é uma problemática de humanidade. Recomendo muito a leitura desse clássico nacional, de linguagem acessível e com uma temática tão importante.

História Repleta de Ironia que Fala Sobre um Nacionalismo Exacerbado

Triste Fim de Policarpo Quaresma foi publicado originalmente em 1911, em formato de folhetim, e editado em livro apenas em 1915. A obra retrata a história de um homem nacionalista que exalta tudo que é genuinamente brasileiro. 

Policarpo é um funcionário público que vive confortavelmente com a irmã, Dona Adelaide. Ambos solteiros e sem filhos, eles compartilham sua rotina e solidão. Policarpo Quaresma é repleto de ideais nobres, que exaltam o país em todas as suas grandezas. Por que há tanta influência externa em um país que já possui tudo de bom e belo? 

O nosso protagonista é tão insistente com o tema do nacionalismo que chega a propor para os órgãos responsáveis que se avalie mudar a língua oficial do Brasil para o Tupi-Guarani. No fim, Policarpo Quaresma foi obrigado a reconhecer que seus esforços e suas benevolências em prol do seu país de nada serviram para livrá-lo do castigo e da morte. 

Triste Fim de Policarpo Quaresma é história repleta de ironia que fala sobre um nacionalismo exacerbado, fonte de riso e insinuações de loucura. Mas que também faz uma crítica fina sobre os políticos e os poderosos da época. Uma obra que é fruto da sua época, mas que reflete o quão andamos em círculos enquanto sociedade.

Afinal, Capitu Traiu ou não o Marido com Escobar?

Narrado sob a perspectiva unilateral de Bento Santiago, somos apresentados a um homem já velho e amargurado, que fora apaixonado desde a infância pela vizinha, Capitu. Destinado a se ordenar padre para pagar uma promessa feita pela mãe, é enviado ao seminário, onde conhece Escobar, outro seminarista sem vocação, que lhe ajuda a se livrar do sacerdócio.

Enfim, casa-se com sua amada Capitu, mas com o nascimento do filho e a morte do melhor amigo, ele se vê diante da dúvida que o perseguiu até a morte. Essa incógnita eternizada nas páginas de Dom Casmurro desperta curiosidade há mais de 100 anos por gerar diversas teorias que vão muito além da condenação ou absolvição da mulher dos olhos de ressaca.

Machado de Assis deu vida a um enredo atemporal, ambíguo e repleto de reflexões sobre a conduta humana. A genialidade de suas artimanhas ao explorar o perfil psicológico dos personagens me fascina de tal forma que eu poderia usar todas as palavras do mundo e ainda assim não conseguiria expressar a magnitude de sua escrita. 

Marcante e envolvente, Dom Casmurro é um clássico da Literatura Brasileira que merece ser lido e refletido por todos aqueles que desejam aprender a lutar contra seus próprios demônios, afinal, até que ponto nossos sentimentos mais mesquinhos justificam as (in)verdades que contamos?

Para João Ser Rico é o que Importa

O Cortiço foi o único clássico que, na época da escola, consegui ler até o final e gostar. Nessa história conhecemos João Romão, um comerciante que tem o objetivo de enriquecer. Para isso, ele se dedica totalmente ao trabalho e opta por viver sem privilégios, para conseguir acumular mais dinheiro.

Com o dinheiro que já tinha, João compra terrenos e constrói pequenas casas, até transformar o local em um cortiço chamado São Romão. Quando seu vizinho, Miranda, recebe o título de Barão, desperta a inveja de João, que logo percebe que ter dinheiro não é o suficiente. Para ser rico, João vivia de privações, mas nem por isso tinha um bom status.

João acaba se aproximando de Miranda e de sua filha, traindo sua amiga Bertoleza, que havia enfrentado todas as dificuldades com ele. A história possui outros personagens ilustres que moram no cortiço e, ao longo do livro, podemos acompanhar um pouco do desenvolvimento de cada um deles.

O Cortiço é uma história que possui vários elementos como traição, inveja e mostra a situação de pobreza vivida pelos moradores do Cortiço, que lutam para ter uma vida melhor. A leitura tem um ritmo mais lento, porém é envolvente e instiga o leitor a saber mais da vida de João e dos seus inquilinos.

Quem é Louco? Quem é São? Quem nos Afirma que o Alienado não é o Alienista?

O Alienista é um conto atemporal. Saber que foi escrito há mais de 100 anos e, mesmo assim, continua fazendo sentido em nossa época, torna a leitura mais prazerosa e educativa. Dr. Bacamarte é um amante da ciência e busca fazer uma avaliação das faculdades mentais de todas as pessoas que conhece. 

Seus pacientes são os que mais sofrem com esse comportamento. Quem é realmente louco? Quem é realmente são? Quem nos afirma que o alienado não é o alienista? Essas questões surgem a todo o tempo durante a leitura e fazem o leitor divagar sobre elas. 

Mesmo em se tratando de um assunto sério, conseguimos sentir um pouco de divertimento com as proezas de Bacamarte. Não posso deixar de citar também a reflexão crítica incrementada pelo autor perante à política: até onde o governo pode interferir na ciência? Coincidência com a realidade? Acredito que não.

Ler Machado de Assis é sempre uma grande experiência. Este conto é incrível e, tenho certeza, vai conquistar os leitores de todas as idades!

E Quando um Morto Decide Escrever sua História?

Como não ficar minimamente curiosa com uma história contada por um defunto? Como o próprio Brás Cubas diz, ele não é um autor defunto, mas um defunto autor. É na sua morte que começa a história que, de acordo com ele, escrita depois de morto ficaria mais galante e nova. E fica!

Diante de situações corriqueiras, o narrador nos mostra sua vida e sua classe social da época de 1800 no Brasil. É um cenário que conhecemos em livros de história e em adaptações televisivas, mas com Machado de Assis a realidade é tratada com irreverência, bom humor e um alto grau de pessimismo. 

É pela ironia que a trama atrai, nos faz refletir e, por conta de um defunto debochado, nos faz enxergar as estruturas ocultas daquela sociedade. Começando por sua morte e intercalando períodos da sua vida, a narrativa divertida de um morto caprichoso é o diferencial da obra.

Talvez a leitura tenha alguns entraves: a escrita rebuscada e palavras que já perderam o uso, mas recomendo que prossiga. Li a primeira vez quando tinha uns 16 anos e reli uns 15 anos depois. É uma leitura para todos, não só por ser um clássico da nossa literatura, mas por tratar de temas tão comuns de uma forma divertida e audaciosa.

Uma Girl Power no Século XIX

Senhora é um romance urbano de José de Alencar. Nele conhecemos Aurélia Camargo, uma jovem de origem humilde que se apaixona por Fernando Seixas. Ambicioso, o jovem a abandona por dinheiro. 

Contudo, numa reviravolta do destino, Aurélia recebe uma enorme fortuna e ascende socialmente. É aí que ela bola uma vingança e decide "comprar" Fernando num dote milionário!

Senhora é um livro que impressiona pela protagonista que foge dos padrões. Aurélia é complexa, profunda, dona de seus próprios ideais e de sua própria independência... uma girl Power do século XIX! O livro traz ainda assuntos bem impertinentes para a época, como a emancipação feminina e uma crítica ferrenha aos casamentos por conveniência.

Apesar do jeito rebuscado de escrever de José de Alencar, todo esse estilo floreado serve para criar um ambiente de sonho, de beleza, de sentimentos arrebatadores... e é toda essa sensibilidade que continua a cativar leitores por todos esses anos. Leia esse livro!

Quando pensamos em clássicos da literatura brasileira, é impossível não vir à cabeça o livro A Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo. Este é um livro atemporal, capaz de nos fazer acreditar no amor puro, singelo e no “felizes para sempre”. O livro começa em torno de quatro estudantes de Medicina conversando sobre sortilégio do amor. 

Augusto se mostra um homem incapaz de amar. Felipe então chama os amigos para um fim de semana na casa da avó, na Ilha de Paquetá, cenário bem desenvolvido para uma trama romântica. Os amigos lhe propõem uma aposta: caso Augusto se envolva sentimentalmente com uma das moças hospedadas na casa, terá que escrever um livro no qual contará a história do seu primeiro amor. 

Utilizando-se da metalinguagem, o estilo de Macedo é de história em prosa, girando no sentimentalismo dos personagens. Com uma linguagem ágil, é capaz de levar o leitor para o centro da ação em determinados capítulos e afastá-lo em outros. Tudo isso com alternados flashabacks nos quais é preciso ceder a voz para determinado personagem.

O livro A Moreninha tece um discurso sobre o Romantismo no Brasil do século XIX, com cortesia e delicadeza, que nos proporciona um “plot twist” original, com a graça e a elegância dos costumes daquela época do Brasil.